Você já pensou que a simplicidade pode ser exercitada? Que há um sacrifício, uma disciplina a ser praticada, bem no meio de nossas vidas complexas, atribuladas e super ocupadas? Ao estudar um pouco sobre a disciplina da simplicidade, percebo o quanto ela é necessária em minha rotina, para trazer equilíbrio e me ajudar a perceber que a complexidade da vida está muito relacionada com as minhas escolhas: aquilo que eu amo e que disputa meu coração com o amor de Deus, me levando a buscar muitas coisas quando apenas uma é necessária.
Neste episódio da Série Disciplinas Espirituais vamos refletir sobre a disciplina da Simplicidade. Busque formas de incluí-la em sua rotina, especialmente se você está cansado(a) da complexidade que a vida assumiu e parece impossível simplificar a rotina, mudar hábitos e comportamentos, dizer não. Que esse exercício faça você aprender a buscar uma coisa só, aquilo que é mais importante e irá orientar o restante de toda a sua vida.
Simplicidade é liberdade, diz Richard Foster.
A simplicidade gera alegria e equilíbrio. A duplicidade gera ansiedade e medo.
O pregador de Eclesiastes 7:29 diz que “Deus nos fez simples e direitos, mas nós complicamos tudo”.
A disciplina cristã da simplicidade é uma realidade interna cujas consequências externas são refletidas no estilo de vida. Tanto o aspecto interno quanto o externo da simplicidade são essenciais. Kierkegaard fala sobre o cerne da simplicidade cristã no livro Pureza de coração é desejar uma coisa só.
Nosso coração pecador deseja muitas coisas e quer todas agora. Nos dividimos correndo para muitos lados simultaneamente e ficamos esgotados. Thomas Kelly no livro ‘Um testamento de devoção’, fala que nos falta um centro divino, algo que oriente e direcione todas as demais coisas que fazemos, nossos anseios, nossas responsabilidades e os muitos afazeres. (2)
Para Kelly nossa vida se tornou muito complexa e culpamos o mundo em que vivemos, só precisamos de mais tempo para conseguir fazer tudo o que queremos. Porém, a real explicação para a complexidade da vida é interior. Não nos falta tempo, nos falta amor. Nos falta um centro que oriente as prioridades e nos ajude a viver momento a momento em dependência de Deus, sem nos agarrarmos à segurança que as coisas nos dão. (2)
Nos falta direcionar a bússola desse amor para o Norte correto, como diz James Smith. Sem esse centro orientador firmado no amor a Deus, vamos correr sempre atrás de muitas coisas que irão ocupar nossos amores e serão refletidas nos hábitos e comportamentos, nos ritmos e nas liturgias que nos moldam todos os dias em alguém sempre ocupado, sempre com pressa, desatento e impaciente. (3)
A simplicidade, então, exercitada como uma disciplina espiritual, seria esse esforço intencional de organizar o centro da vida em Deus, buscando o seu Reino e a sua justiça em primeiro lugar. E como consequência, a simplicidade vai aparecer em várias atitudes externas, nas escolhas que fazemos e em uma curadoria de nossos hábitos. Aprenderemos a dizer não a muitas coisas, mesmo que boas e interessantes, porque não podemos fazer tudo, ler tudo, aceitar todos os convites, fazer todos os cursos, ir em todas as reuniões, e assim por diante. (4)
Precisamos fazer escolhas quanto ao que comprar, evitando acumulo de coisas desnecessárias e que não podemos pagar; rejeitando hábitos e comportamentos que se tornam vícios; exercitando mais a generosidade através da doação de suas coisas; aprendendo a desfrutar das coisas sem possuí-las, compartilhando com os outros; evitando distrações que nos afastem de buscar o reino de Deus. A busca intensa por outras coisas ainda que legítimas e boas, pode facilmente nos levar a perder o rumo. (4)
Por isso a simplicidade parte da confiança na provisão e sustento de Deus, nas suas dádivas concedidas a nós em todas as áreas, e se reflete em nossa resposta no modo como organizamos a vida. A simplicidade de coração poderá florescer apenas no solo fértil da fé, e é justamente a afirmação da fidelidade e da bondade de Deus, que abre a porta para essa confiança. (5)
A simplicidade implica o retorno à postura de dependência de Deus e a resposta em obediência a Ele.
A mais profunda realidade da dependência e da obediência é o tipo de espírito que elas desenvolvem em nós. É um espírito que crucifica a cobiça e o desejo de ostentação — atingindo diretamente nossos hábitos de consumo. É um espírito de compaixão e assistência — fomentando a generosidade e o compartilhar do que temos. É um espírito de sensibilidade e confiança — nos ajudando a escolher apenas o que é necessário. (5)
Como consequência, podemos exercitar a simplicidade em nosso modo de vida, através de atitudes como eliminar excessos, doar produtos não utilizados, discernir comportamentos viciantes e eliminá-los, reduzir tudo o que pode estar ocupando muito espaço ou muito tempo.
A simplicidade, assim, se torna também um modo de vida baseado na suficiência do que recebemos de Deus, diariamente. E um convite para pensarmos na complexidade que nossa vida adquiriu. Em todos os compromissos, atividades e demandas. Será que todas são essenciais e necessárias? O que podemos dizer não, o que podemos eliminar ou reduzir?
Fica o convite para exercitar a disciplina da simplicidade e fortalecer o centro orientador de tudo o que fazemos e somos: Jesus Cristo. Cristo não é apenas alguém em quem eu acredito que existiu e cujas ações têm influência sobre mim. Ele é o centro. Ele é tudo. Ele é alguém COM quem eu vivo, DE quem recebo a vida e PARA quem eu vivo. Ele é a própria vida que flui em mim e que me capacita a viver cada dia: a respirar, a trabalhar, a amar, a aprender, a sofrer, a vencer as dificuldades. Ele é o centro do sentido e o ponto de integração de toda existência.
Com esse centro ajustado, podemos viver com simplicidade e alegria o dia de hoje.
Efésios 5:15 diz “Portanto, sejam cuidadosos em seu modo de vida. Não vivam como insensatos, mas como sábios.”
Oremos
Pai querido, entregamos ao Senhor tudo o que carregamos e que nos pesa os ombros, a complexidade que a vida tomou e nossa luta para dar conta de tudo. Clamamos por socorro para que possamos aprender a viver uma vida simples, que deseja uma coisa só: que venha o seu Reino e seja feita a sua vontade. Ajuda-nos, Senhor Jesus, a viver momento a momento em dependência do Senhor e a fazer escolhas sábias. Amém.
Referências citadas no texto:
(1) Dallas Willard. A Grande Omissão. São Paulo: Mundo Cristão, 2008. Essa pergunta está nas páginas 101–102. (os itálicos estão no texto original)
(2) Thomas Kelly. Um Testamento de Devoção. Brasília: Palavra, 2012.
(3) James K.A. Smith. Você é aquilo que ama. São Paulo: Vida Nova, 2017.
(4) Richard Foster. Celebração da Disciplina. São Paulo: Editora Vida, 2007.
(5) Richard Foster. A Liberdade da Simplicidade. São Paulo: Editora Vida, 2008.